15 de outubro de 2010

Comer Rezar Amar


Afogar as mágoas viajando pelo mundo, conhecendo lugares e gente bonita é muito bom! Haverá terapia melhor? E sem se preocupar com dinheiro. Esse foi o caso da escritora americana Elizabeth Gilbert que escreveu a autobiografia: Comer rezar amar em que relata a viagem pela Ítalia, Índia e Indonésia. O livro virou best-seller e já vendeu mais de 4 milhões de exemplares e agora está nas telas do cinema numa adaptação de Ryan Murphy.

Para quem não assistiu ao filme: Liz (interpretada por Julia Roberts) se encontra infeliz na sua vida e no seu casamento, com dúvidas se a maternidade lhe cairá bem e se deseja ter uma família nos moldes da sua mãe. Ela enfrenta um divórcio traumático ao mesmo tempo em que se entrega a um novo amor (James Franco). Sua tristeza e carência, porém, são responsáveis pelo naufrágio do seu romance. Liz decide então fazer uma viagem, como ela própria intitula de “autodescoberta”, a fim de conhecer a Itália, onde exercita o prazer de comer; a Índia para praticar a arte da devoção, e por fim visitando a Indonésia, onde espera encontrar equilíbrio entre as duas coisas. Talvez a autora quisesse comprovar a veracidade do aforismo de Sócrates: “Conhece-te a ti mesmo e serás imortal”.

O filme é fraco! Aquele velho problema das adaptações literárias que não ficaram bem nas telas. Perdeu-se a essência do livro, os verbos do título não foram bem conjugados no filme, e algumas cenas ficaram tolas e sem sentido. Os diálogos têm muitas frases e conselhos ‘ralos’, ou seja, sem profundidade, de lideres espirituais que mais parecem tirados de biscoitos da sorte. Julia Roberts incorporou o papel, mas não há muita química entre ela e o brasileiro interpretado pelo espanhol Javier Bardem, que não convenceu com o seu português carregado de sotaque. O bom do filme é a fotografia, imagens de Bali e flashes de uma Roma magnífica e convidativa para o “dolce far niente”.

Assim como aconteceu com O Código da Vinci, em que muitos turistas refazem o caminho percorrido em Paris pelos personagens do livro da trama de Dan Brown. O "turismo religioso" de Liz deve ter incentivado muitas mulheres pelo mundo afora, em busca de preencher o vazio da alma e loucas para encontrar um ‘Javier’ "prá chamar de seu!"

Elizabeth é aparentemente uma mulher forte, que teve a coragem de ‘virar a própria mesa’, ao se encontrar infeliz, pediu demissão do emprego para passar um ano viajando. Romper com o conhecido, que te faz infeliz, mas que te dá segurança, não é fácil, principalmente para as mulheres. Se somos autores das nossas escolhas e omissões, onde podemos fazer sacrifícios? Aonde nossas escolhas estão nos levando? Será que não devemos raciocinar como o gato de Alice (o gato a que me refiro é o de Lewis Caroll) : O caminho a seguir, depende de para onde se quer ir! Mas se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve. No entanto, é preciso está em paz com as nossas escolhas.

Na busca da ‘transcendência divina’, porém, a personagem deseja um deus que se encaixe na vida dela, mais não o contrário. Porque ela própria já se julga um deus. Mas um deus fajuto que não consegue resolver nem os seus problemas existenciais e se livrar da depressão. Ao mesmo tempo, Liz afirma que deseja alguém que lhe mostre Deus. Não precisamos viajar à Índia para encontrar um deus, podemos encontrar Deus sem sair de casa, pois ele é onisciente, onipresente e onipotente. Jesus Cristo é o único caminho que leva a Deus! Ele diz: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim”. (BÍBLIA. N.T. João, 14:6) Deus só faz morada em nosso coração se primeiro abrirmos a porta para ele. O livro está cheio de enganos com relação a Deus. Como por exemplo afirma que céu e inferno são a mesma coisa e ambos são amor! Se ambos são amor por que a autora procura o divino? Céu e inferno existem: “Portanto o inferno grandemente se alargou, e se abriu a sua boca desmesuradamente; e para lá descerão o seu esplendor, e a sua multidão, e a sua pompa, e os que entre eles se alegram.” (BÍBLIA. A. T. Isaías, 5: 14). Cabe a cada um escolher!

Ively Almeida


1 de outubro de 2010

“Duas coisas enchem-me o espírito de admiração e respeito [...] O céu estrelado lá fora e a lei moral dentro de mim”. Kant

Museu do Vaticano


Conversa no MSN, com Rubem B. Oliveira, sobre a degradação moral do ser humano nos dias atuais.

Segundo o filósofo alemão Kant, do século xviii, o ser humano é o fundamento de si mesmo, tanto em relação à produção do conhecimento (livro: a crítica da razão pura) como em relação aos parâmetros da moral e da ética (a crítica da razão prática). Dessas duas monumentais obras, a segunda é o que interessa para a minha rápida conclusão sobre essa encruzilhada desse nosso processo civilizatório.

Para que o homem seja o fundamento de si mesmo, seria necessário que ele tivesse algo de essencialmente diferente dos demais seres vivos. A essência do homem é a liberdade. O ser humano é livre. Sartre afirma que o homem está condenado à liberdade, ele tem, sempre, que escolher, e mesmo que não escolha, já é uma escolha.

Se o mundo do homem é o mundo da escolha e não da ordenação mecânica, ou instintiva, o ser humano tem que escolher por si mesmo: o que vai comer, como vai se relacionar com a natureza e com o próximo, essas relações não estão dadas como no mundo animal.

Se essa relação com o próximo, por exemplo, não está dada, ele tem que construí-la, no dia a dia e socialmente. E pra construir uma relação para o convívio social (nenhum homem é uma ilha) ele precisa de um princípio universal, que seja bom para ele e para todos, e na sua obra: a crítica da razão prática, Kant expõe esse principio (a partir do qual ele vai construir todo o seu discurso ético e moral)

Esse princípio é simples, e há quem diga que ele se inspirou na Bíblia, para construir tal princípio “a minha liberdade termina quando começa a do outro” ou “nunca faça ao próximo o que não gostaria que fizessem a você mesmo”, o princípio ético bíblico seria “amai ao próximo como a ti mesmo” é claro que existem diferenças “mas existe uma certa semelhança, na intenção no geral, que é o “respeito”. no princípio bíblico tem a questão do amor etc.

O problema é que estamos em falta com esse, ou esses princípios, eles são parte do discurso ético, mas não da formação ética do nosso mundo “pós moderno” onde tudo ou quase tudo relativizou-se.

Esses princípios pulverizaram-se.

Quem vai resgatar esses princípios: a justiça, a família, a escola, as igrejas etc. nós, nesse fio tênue do cotidiano?

Se o ser humano é “livre” para fazer as suas escolhas, e ele é quem faz suas próprias escolhas, então ele deve está fazendo a escolha errada, e se somos capazes de julgar nossas escolhas, se ela é boa ou ruim, onde está a origem desse problema?

Onde devemos, ou em que momento esse problema deve começa a ser corrigido? Se eu não estou enganado foi Rui Barbosa que disse “Eduquem as crianças e não precisarás julgar os homens” Mas será que só uma boa educação ou formação é suficiente?

Não será que esses princípios éticos e os valores materialistas, consumistas, da riqueza medida apenas em termos de dinheiro, do nosso capitalismo que ignora tudo que não pode ser transformado em dinheiro, e que destrói tudo, indiscriminadamente, para transformar em dinheiro, não estão em choque, e chegamos numa grande encruzilhada, e que teremos que fazer a grande escolha, ‘A Escolha’:

Ou esse sistema capitalista que tudo destrói e divide ou nossos princípios tão caros a humanidade, tão importante para o nosso aprimoramento, e para um feliz convívio comunitário e em comunhão escolheremos o essencial: “o que é invisível aos olhos.”

Fizemos por acaso uma opção pela felicidade individualista dos bens materiais, mais ainda há tempo e visão para enxergarmos uma outra concepção de felicidade.

A ‘felicidade’ que tiramos dos bens materiais, pode ser tirado com a mesma intensidade ou até mais de outros valores: amizade, fraternidade, solidariedade, altruísmo, lealdade etc., as atitudes de grandes homens da história estão carregados de tantos valores: Cristo, Gandhi, Buda, independente de religião...

A nossa crise ética e moral é uma crise de conflitos de valores: acreditamos que devemos respeitar a natureza mas queremos nossos móveis de “mogno” que tem que ser mudado todos os anos, pois temos que estar na moda, acreditamos no valor do outro, filho de Deus como eu, portador de direitos humanos como eu, mas quero e preciso comprar produtos, que são produzidos por trabalho infantil, por trabalhadores que ganham salários miseráveis. Valorizo a humildade, mas, vivo e quero a ostentação, valorizo e admiro Cristo dividindo pães e peixinhos, mas quero, e acumulo riquezas, excluindo uma multidão do mínimo para sobreviver...

Onde você mora? Moro na civilização ocidental ‘cristã capitalista’, que paradoxo é esse? Como desatar esse nó, esse cinismo, essa hipocrisia? Oh! Vós que entrais aqui, abandonai todas as esperanças. “Dante no inferno.”

Se o significado da palavra diabo é aquele que divide, e a nossa civilização está dividida, entre os valores que prega e realmente precisa, e os valores que realmente pratica e reproduz, então, essa civilização é do diabo.

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Rubem Oliveira é Professor de História com pós-graduação em Ensino de História.