1 de outubro de 2010

“Duas coisas enchem-me o espírito de admiração e respeito [...] O céu estrelado lá fora e a lei moral dentro de mim”. Kant

Museu do Vaticano


Conversa no MSN, com Rubem B. Oliveira, sobre a degradação moral do ser humano nos dias atuais.

Segundo o filósofo alemão Kant, do século xviii, o ser humano é o fundamento de si mesmo, tanto em relação à produção do conhecimento (livro: a crítica da razão pura) como em relação aos parâmetros da moral e da ética (a crítica da razão prática). Dessas duas monumentais obras, a segunda é o que interessa para a minha rápida conclusão sobre essa encruzilhada desse nosso processo civilizatório.

Para que o homem seja o fundamento de si mesmo, seria necessário que ele tivesse algo de essencialmente diferente dos demais seres vivos. A essência do homem é a liberdade. O ser humano é livre. Sartre afirma que o homem está condenado à liberdade, ele tem, sempre, que escolher, e mesmo que não escolha, já é uma escolha.

Se o mundo do homem é o mundo da escolha e não da ordenação mecânica, ou instintiva, o ser humano tem que escolher por si mesmo: o que vai comer, como vai se relacionar com a natureza e com o próximo, essas relações não estão dadas como no mundo animal.

Se essa relação com o próximo, por exemplo, não está dada, ele tem que construí-la, no dia a dia e socialmente. E pra construir uma relação para o convívio social (nenhum homem é uma ilha) ele precisa de um princípio universal, que seja bom para ele e para todos, e na sua obra: a crítica da razão prática, Kant expõe esse principio (a partir do qual ele vai construir todo o seu discurso ético e moral)

Esse princípio é simples, e há quem diga que ele se inspirou na Bíblia, para construir tal princípio “a minha liberdade termina quando começa a do outro” ou “nunca faça ao próximo o que não gostaria que fizessem a você mesmo”, o princípio ético bíblico seria “amai ao próximo como a ti mesmo” é claro que existem diferenças “mas existe uma certa semelhança, na intenção no geral, que é o “respeito”. no princípio bíblico tem a questão do amor etc.

O problema é que estamos em falta com esse, ou esses princípios, eles são parte do discurso ético, mas não da formação ética do nosso mundo “pós moderno” onde tudo ou quase tudo relativizou-se.

Esses princípios pulverizaram-se.

Quem vai resgatar esses princípios: a justiça, a família, a escola, as igrejas etc. nós, nesse fio tênue do cotidiano?

Se o ser humano é “livre” para fazer as suas escolhas, e ele é quem faz suas próprias escolhas, então ele deve está fazendo a escolha errada, e se somos capazes de julgar nossas escolhas, se ela é boa ou ruim, onde está a origem desse problema?

Onde devemos, ou em que momento esse problema deve começa a ser corrigido? Se eu não estou enganado foi Rui Barbosa que disse “Eduquem as crianças e não precisarás julgar os homens” Mas será que só uma boa educação ou formação é suficiente?

Não será que esses princípios éticos e os valores materialistas, consumistas, da riqueza medida apenas em termos de dinheiro, do nosso capitalismo que ignora tudo que não pode ser transformado em dinheiro, e que destrói tudo, indiscriminadamente, para transformar em dinheiro, não estão em choque, e chegamos numa grande encruzilhada, e que teremos que fazer a grande escolha, ‘A Escolha’:

Ou esse sistema capitalista que tudo destrói e divide ou nossos princípios tão caros a humanidade, tão importante para o nosso aprimoramento, e para um feliz convívio comunitário e em comunhão escolheremos o essencial: “o que é invisível aos olhos.”

Fizemos por acaso uma opção pela felicidade individualista dos bens materiais, mais ainda há tempo e visão para enxergarmos uma outra concepção de felicidade.

A ‘felicidade’ que tiramos dos bens materiais, pode ser tirado com a mesma intensidade ou até mais de outros valores: amizade, fraternidade, solidariedade, altruísmo, lealdade etc., as atitudes de grandes homens da história estão carregados de tantos valores: Cristo, Gandhi, Buda, independente de religião...

A nossa crise ética e moral é uma crise de conflitos de valores: acreditamos que devemos respeitar a natureza mas queremos nossos móveis de “mogno” que tem que ser mudado todos os anos, pois temos que estar na moda, acreditamos no valor do outro, filho de Deus como eu, portador de direitos humanos como eu, mas quero e preciso comprar produtos, que são produzidos por trabalho infantil, por trabalhadores que ganham salários miseráveis. Valorizo a humildade, mas, vivo e quero a ostentação, valorizo e admiro Cristo dividindo pães e peixinhos, mas quero, e acumulo riquezas, excluindo uma multidão do mínimo para sobreviver...

Onde você mora? Moro na civilização ocidental ‘cristã capitalista’, que paradoxo é esse? Como desatar esse nó, esse cinismo, essa hipocrisia? Oh! Vós que entrais aqui, abandonai todas as esperanças. “Dante no inferno.”

Se o significado da palavra diabo é aquele que divide, e a nossa civilização está dividida, entre os valores que prega e realmente precisa, e os valores que realmente pratica e reproduz, então, essa civilização é do diabo.

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Rubem Oliveira é Professor de História com pós-graduação em Ensino de História.

Um comentário:

Anônimo disse...

Que belo texto! Um pouco d Kant. de uma forma simples e clara.